10 mil horas. Empreendedor ?

M. Gladwell no livro "Outliers" apresenta a 'regra das dez mil (10.000) horas'. A mestria num tema exige 10.000 horas de prática, i.e., 5 a 6 anos (em dias de 8 horas, semanas de 5 dias e anos de 40/44 semanas).

Se aplicarmos a regra ao empreendedorismo, alguém seria empreendedor depois de 10.000 horas Será assim ? Estou convicto que sim. Porque ser empreendedor seria diferente de ser cirurgião, piloto de avião, cozinheiro, carpinteiro, músico, soldador, agricultor, pescador ou qualquer outra actividade humana ?

Então só serei empreendedor depois das 10.000 horas ? Penso que a resposta é a mesma para as outras artes. Num momento inicial há a intenção em ser; somos aprendizes de...; à medida que o tempo passa, vamos ganhando mestria no tema, até nos sentirmos confiantes em 'voar sozinhos'. Há um momento em que deixamos de contar, e pouco depois, pelo menos é a nossa percepção, já passaram as 10.000 horas e mais uns anos ;-)

Daqui resulta dois pontos:
a) Como aprendiz devo ter um mestre - um ou mais mentores - não precisa ser uma pessoa, pode ser uma comunidade de pessoas, como o João Sem Medo Center; mas tenho que ter referências dos temas e áreas em que estou a trabalhar - modelos/ referências.

b) Devo ter um 'recreio', 'um simulador', onde possa brincar, experimentar sem 'cair pelas escadas abaixo', 'sem deitar o avião ao chão' ou 'matar o doente'; são exemplos organizar eventos, sejam viagens, festas, ter vida associativa, liderar projectos em que alargo a minha zona de conforto; posso e devo fazer isto ao longo do tempo, passo a passo, começando o mais cedo possível. Mas se não começei cedo, não esta nada perdido; posso juntar-me a uma comunidade e começar a fazer isso agora: e.g. João Sem Medo Center, Beta-i.

Estando numa comunidade, há diferença em estar numa comunidade intencional, que nasceu com a intenção ser ser esse laboratório, de ser o espaço onde se aprende a lidar com a incerteza, passo a passo. Uma comunidade que esta focada na pessoa e nos seus baby-steps. Onde não acertar faz parte do processo de aprendizagem e não de colapso da auto-estima. Quando no João Sem Medo estou a ajudar a organizar o 'ask experts' ou o 'ciclo de workhops "Todos podem aprender empreendedorismo", estou a brincar neste recreio, onde alargo a minha zona de conforto. Mas porque é intencional estou a ganhar a vários níveis: estou a criar relações, conhecendo pessoas e organizações, que podem ser meus clientes, parceiros, colaboradores, sócios, ... estou a melhorar os meus skills de relacionamento; estou a conhecer-me melhor, a perceber o que gosto, o que me dá prazer, o que me faz zangar e porque; estou a lidar com os meus dragões (medos), observando os outros que já fazem a fazer; estou a construir a minha identidade, a minha auto-estima; estou a procurar o meu 'sentido', porque estou a fazer e a sentir, se o que faço faz sentido para mim ou não; estou a ganhar as minhas 10.000 horas como empreendedor.

Eu comecei muito cedo: lembro-me os 6 anos fazer recados aos meus pais sozinho, fora de casa. Ia para a escola sozinho. Aos 10 anos para além de ir para escola sozinho, ia para o andebol, e para o conservatório: entre transportes públicos e a pé (triângulo com 5km entre os lados); aos 15 organizei uma viagem de finalistas; aos 16-17 pertencia a 2 associações e por ai fora...

Há uma diferença entre o empreendedor e outra arte: é que um cirurgião pode ser empreendedor, i.e., para se ser empreendedor, temos que ter também uma arte. Ou as duas andam a par - foi o meu caso com a Safira (engenharia informática e empreendedorismo) - ou uma terá que vir a seguir a outra (carreira em engenharia informática e mais tarde torno-me empreendedor em engenharia informática - caso: widgilabs). Se o meu objecto de empreendedorismo mudou em relação à minha experiência inicial (e.g. era gestor de projecto e já tinha as 10.000 horas e agora vou empreender em comércio, terei que ganhar as 10.000 nas duas: comércio e empreendedorismo - caso Kiss the Cook).

Comentários

nunorod disse…
Verdade Marco. A sensação de avançar no conhecimento é real, sejam 10.000 horas ou 100 ou 200.000. Sente-se o passar do curioso para o aprendiz, é algo que se sente de facto, quase palpável e só quem o está a fazer é que consegue perceber como é.

Mas puxaste um detalhe muito interessante, do qual raramente nos apercebemos quando estamos a alimentar a sede de aprender, precisamos de algo com o qual experimentar, uma matéria para moldar e na qual experimentar e é demasiado fácil deixar passar isso ao lado, pensando nós que já temos muito conhecimento, mas que sem o colocar em prática, dificilmente temos a real percepção do seu uso.

O "laboratório" onde brincar e falhar é importantíssimo e esse conceito passa muito despercebido.
nunorod disse…
Verdade Marco. A sensação de avançar no conhecimento é real, sejam 10.000 horas ou 100 ou 200.000. Sente-se o passar do curioso para o aprendiz, é algo que se sente de facto, quase palpável e só quem o está a fazer é que consegue perceber como é.

Mas puxaste um detalhe muito interessante, do qual raramente nos apercebemos quando estamos a alimentar a sede de aprender, precisamos de algo com o qual experimentar, uma matéria para moldar e na qual experimentar e é demasiado fácil deixar passar isso ao lado, pensando nós que já temos muito conhecimento, mas que sem o colocar em prática, dificilmente temos a real percepção do seu uso.

O "laboratório" onde brincar e falhar é importantíssimo e esse conceito passa muito despercebido.
nunorod disse…
Verdade Marco. A sensação de avançar no conhecimento é real, sejam 10.000 horas ou 100 ou 200.000. Sente-se o passar do curioso para o aprendiz, é algo que se sente de facto, quase palpável e só quem o está a fazer é que consegue perceber como é.

Mas puxaste um detalhe muito interessante, do qual raramente nos apercebemos quando estamos a alimentar a sede de aprender, precisamos de algo com o qual experimentar, uma matéria para moldar e na qual experimentar e é demasiado fácil deixar passar isso ao lado, pensando nós que já temos muito conhecimento, mas que sem o colocar em prática, dificilmente temos a real percepção do seu uso.

O "laboratório" onde brincar e falhar é importantíssimo e esse conceito passa muito despercebido.
Amelia disse…
Muito trabalho pela frente... :P

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